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quarta-feira, 20 de abril de 2011

HOMENAGEM PÓSTUMA A DOMINGOS CARVALHO

Não faria sentido estarmos reunidos neste local com o propósito de prestarmos uma sentida homenagem ao nosso querido Domingos sem que tecêssemos algumas considerações sobre a convivência que com ele tivemos e, na qual, sempre revelou as suas elevadas qualidades.
Foi sem dúvida neste local, neste espaço, próximo das fraldas da Louriça, pintado de verde pelos seus extensos tabuleiros de relva macia e, em que as copas das árvores me parecem encostar-se como querendo proteger-nos do beijo das suas matizadas sombras, o ambiente em que mais privámos com o Domingos e obsevámos o seu entusiasmo, as forças de um espírito vocacionado para o convívio entre os amigos.
Se, assim, sucedeu, convém dizê-lo aos familiares e amigos aqui presentes, foi porque este espaço e suas áreas circundantes, vem sendo o lugar escolhido para acolher o ponto alto que são as festas anuais do Nevosa. Festas estas a que o Domingos chamava de festinha;- quando volta a ser a nossa festinha; muitas vezes lhe escutávamos esta frase.
Foi junto destas estruturas graniticas que o Domingos, talvez por virtude da empatia que lhe era imanente, tinha a mesa que escolhia rodeada de pessoal desejoso de partilhar da sua alegre presença. Não direi de imediato, mas à medida que os deliciosos manjares, preparados pelos improvisados e dedicados cozinheiros, iam sendo degustados com o suave empurrão do néctar que se sumia das garrafas, a um ritmo que até o Deus Baco, por cima da copa das árvores, parecia aplaudir, então,a amena cavaqueira resultavva em sonoras gargalhadas que contagiavam os colegas das outras mesas.
Por essa altura já haviam colegas a desculpar-se com ataques de «sinusite,»-pela parte que me diz respeito posso dizer que nunca peguei ao Domingos essa «patologia» e se alguma vez tal sucedeu ele curava a doença sem ser notado: Dormia fora da tenda e parecia ter os sentidos voltados para a contemplação mítica de um céu crivado de estrelas.
Mas pondo a «sinusite» de lado e voltando à mesa, pois, era nesta que o Domingos fazia a exortação do carinho que tinha pelos amigos, chamando, espontâneamente, oh! cidadão, oh! armadilhas: Quando observava alguém que estava mais aprumadinho no vestuário, para aquela ocasião e circuntâncias- lá dizia ele; sempre me estás cá uma «putinha».
A malta no apogeu da alegria, de polegar erguido, tratava-o e chamava-lhe o EL-COMAMDANTE; o Domingos replicava e como o mesmo dedo levantado e com largo sorriso repetia- eu sou o comandante. Outra expressão que lhe ouviamos,amiudadas vezes, tavez, nos momentos em que estava a apreciar situações particularmente confortáveis, era proferir isto é «RILAY», isto é rilay, repetia ele.
-Doutor o discurso, quando é que faz o discurso; respondia-lhe que só quando chegasse a noite.
Interligado ao discurso,vindo de referir, estão umas quadras com que surpreendi o Domingos na última festa que aqui realizámos e que decorreu poucos dias depois do S.João em Braga. Por isso, ao declamar essas quadras, eu não só invocava o S.João como escolhi o refrão como sendo o S. João da Ponte.
Pegando nunca vim de dizer atràs o que me inspirou a surpreendê-lo, com tais quadras, foi o seguinte facto que vou procurar resumir.
Uma noite, em que estava sózinho a fumar o meu cigarro, o Domingos abeira-se de mim para me dizer em tom solene e impregnado de convicção-doutor estou a pensar ir para padre. Estava habituado às suas graças e brincadeiras, mas o modo sério
com que me abordou, levou-me a pensar que o Domingos, pelo menos por essa ocasião, não estava a «reinar».
Confesso ter andado uns dias perdido em cogitações, mas acabei por dar o rumo certo ao meu pensamento-o Domingos a padre era impensável, seria mais fácil acreditar que tinham visto um lobo a andar de bicicleta. O certo é que o episódio teve por desfecho os versos que vou transcrever e que dediquei ao Domingos no discurso da já referida noite.

OH! meu São João da Ponte
Dum teu milagre me valho
Tira a ideia de ser padre
Ao Dongos de Carvalho.

Se ele for para padre
Deixa a nossa companhia,
Não leva freira nem comadre
E deixa o «rilay» na sacristia.

Não sabemos se aguenta
Vai ser tanta a privação!
Troca o vinho por água-benta
E atura o sacristão.

As quadras parecem ter sido milagreiras, pois nunca mais o Domingos me falou em ser padre.
A oito de Maio de 2009, dia do aniversário do Domingos, levou-me a Trás-dos-Montes; a recordação que tenho desse dia ficará definitiva e imutável: Exorbitei de alegria, se o riso afogasse teria sido uma vítima do naufragio da ridente jornada em que embarcámos.
Apresentou-me a um universo de amigos, na maioria seus clientes e que o tratavam com uma afeição de cariz familiar. Depois de ter arrumado os seusnegóciois levou-me a umas instalações que me pareciam ser um Centro Social; logo, ali, as senhoras lhe apresentaram um bolo de aniversário e abriram uma garrafa de champanhe; cantou-se-lhe, ainda que, discretamente, os parabéns: A certa altura o Domingos passou-me uma garrafa para as mãos enquanto me dizia para beber; tinha andado, por aquela ocasião, por diversos locais, esqueci-me de que já tinha a minha conta. Para piorar as coisas a garrafa pareceu-me de sumol, metia-a à boca e tavez não me tivesse atido nos tragos. Desertei do convívio para o logradouro das instalações, pois, estava a sentir um ataque de «sinusite»?: Já fazia a mim próprio a pergunta total: Que é isto, ou melhor:Onde estou? porque estou aqui? Felizmente, com alguma estratégia, a «sinusite» passou-me depressa, pelo que não deixei o Domingos ficar mal.
Muitas coisas agradáveis eu teria para dizer sobre o Domingos: Recordo um dia em que ele na companhia da Bebely e eu de minha mulher fomos a uma festa de confraternização de sargentos-milicianos. Na nossa mesa só nos tocou pessoal estranho, mas o Domingos com a sua imanente empatia quebrou o «gêlo», exibindo um à vontade que foi a determinante vital para um diálogo em comum com os presentes. Recordo que já de saída, e na passagem pelo salão de um bar, entrou em conversa com uma personagem que devia ser o chefe daquele espaço e este convidou-o e à Bebely para ficarem mais um tempo com o pretexto de que uma orquestra iria dar início a música para dança.
Chegado a este ponto quero simplificar sem deformar, isto é, centrar a atenção do que para mim era uma essencialidade no Domingos sem descurar o acessório, por serem dois elementos que matizavam a sua maneira de ser.
Conheci no Domingos um homem corajoso e, por mercê dessa sua valentia e coragem, lhe devo o ter saído incólume de uma situação em que ele, correndo grande risco, me livrou do perigo de ficar na sujeição das leis da física. Muitas vezes, num esboço de gratidão lhe lembrei esse episódio, mas o Domingos não lhe dava a mínima relevância, o que, aliás, não me surpreendia pois, estava na linha da sua maneira de ser; ele pautava a sua conduta pela humildade com dignidade
Homem de boa-fé e sério nos seus negócios; daí o ter nos clientes um trato familiar.
O melhor tributo que a minha memória lhe poderá fazer é procurar ser como ele, ter o prazer em fazer amigos.
Gerou muitas mizades, que como a sombra da tarde, crescerão sempre na nossa memória até ao ocaso da vida.
Se para a família as expressões do Clube Nevosa, a que ele pertencia, se fazem deserto, no sentido de tomarem consciência da felicidade quando se sentem infelizes, resta-nos no vértice da nossa ambição, pedir-lhes que se esforcem por seguir a alegria que sempre distinguimos no Domingos.
Pois se ele era tão alegre, recriminar-nos-á, por avançarmos tristes na busca de alcançarmos um lugar que nos foge e no qual, o Domingos, certamente, nos observa.
O coração nunca envelhece, se às vezes basta um sorriso, um nada, o Domingos que foi uma síntese de sorrisos, iluminará e aquecerá os nossos corações para sempre.

Uma salva de palmas para o Domingos
Aos 9 de Abril de 2011

AFONSO COSTA

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